A carruagem do rei

 

Aninharam-se cupins

na carruagem do rei,

peça arcaica de museu

que jaz em suntuosa garagem.

Dizem que vão restaurá-la,

restituir-lhe o imperial esplendor

para embevecer os visitantes.

 

Mas no país onde um dia o rei mandou,

há crianças vivendo em sórdidos barracos

fincados em favelas e alagados.

Crianças que convivem com a imundície

e em cujos ventres túmidos

se aninham parasitos.

 

Que faria o rei de antanho,

de barbas brancas e olhos azuis,

se as visse em tal estado?

Os régulos de hoje

prometem, falam, falam,

e, no fim, não fazem nada.

 

Na urna funerária, onde jazem,

as cinzas do rei estremecem,

como a perguntar:

"Foi esta a terra que um dia governei?

Foi este o povo de que um dia fui rei?"

 

Domingos Paschoal Cegalla

Rio, 31/07/94

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